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Devagar e sempre? A importância dos treinos de baixa intensidade na bike

19 julho, 2024

Além de trazer muitos benefícios para o desempenho, os pedais em ritmo de resistência também são ótimos para sua saúde

Quando pensamos em treinos de ciclismo ou mountain bike, a imagem de alguém se esforçando intensamente sobre a bicicleta, possivelmente enfrentando uma subida desafiadora, vem imediatamente à mente. Afinal, quanto mais você se esforçar nos treinos, melhor será seu desempenho, certo? 

Na verdade, isso é apenas parcialmente verdadeiro. Isso porque, o que muitas pessoas não sabem, é que os treinos de baixa intensidade, realizados em ritmo de resistência, também desempenham um papel crucial no desempenho dos grandes atletas e na saúde de qualquer pessoa.

Para falar um pouco mais sobre este assunto, conversamos com treinador Gabriel Vargas, formado em Educação Física, com mestrado pela Unicamp. Vargas tem uma década de experiência com treinamento de atletas de ciclismo e mountain biking em diversos níveis.

O que é o treino em baixa intensidade?

Para ser efetivo, o treino de baixa intensidade deve ser realizado em um nível de esforço específico, conhecido no mundo das atividades físicas como “Zona 2” ou Z2. Nesta zona de treinamento, o corpo do atleta passa por uma série de adaptações importantes, que formam a base necessária para atingir o melhor desempenho.

“É muito comum utilizarmos um sistema com 5 zonas de treinamento, indo da zona 1 até a zona 5, sendo a zona 1 a mais “leve” a zona 5 a mais “difícil””, explicou Vargas.  

“Essas zonas fazem referência ao treinamento monitorado via frequência cardíaca, pois é o parâmetro que atualmente melhor representa o impacto que seu organismo está sofrendo sob as condições do exercício. É possível utilizar o esforço percebido pelo ciclista como referência, e também podemos, em certas situações, utilizar a potência. Mas, para nossos propósitos, é melhor pensarmos em frequência cardíaca, por enquanto”, complementou.

Segundo o treinador, o treino em Z2 é uma sessão de treino, ou parte dela, em que o ciclista busca manter-se dentro dessa zona. Nela, a percepção é de um treino relativamente leve, com respiração bastante confortável, não ofegante. Um excelente teste para saber se o ciclista não está exagerando é a capacidade de falar frases inteiras em voz alta a qualquer momento. Mas, mesmo assim, ele pode ter um grande impacto no organismo:

“Um bom treino em Z2, no entanto, não é extremamente fácil. Quando bem executado, o ciclista pode se surpreender com o quão desgastante um treino em Z2 pode ser, especialmente se for contínuo, sem interrupções e sem alívios em descidas e trechos planos”, explicou o treinador. 

Inclusive, justamente por não contar com subidas ou descidas e nenhum outro tipo de variação, o rolo de treino acaba sendo uma das melhores opções para quem deseja investir nos treinos em Z2. Com ele, manter o nível de esforço recomendado é muito mais fácil, o que acaba se traduzindo em treinos mais curtos e eficientes. 

Os benefícios para o desempenho e para a saúde

Apesar de ter seus momentos de altíssima intensidade, o ciclismo e suas modalidades são esportes de resistência. Isso significa que não basta apenas ser forte ou ter potência; é necessário sustentar essas capacidades por períodos prolongados ou ser capaz de repetir os esforços várias vezes ao longo de um percurso ou prova, e é justamente aí que entram os benefícios do treino de baixa intensidade:

“Em Z2, a intensidade é baixa o suficiente para permitir que o organismo privilegie o metabolismo lipídico, ou seja, “queimar gordura”. O uso da gordura como combustível é um processo aeróbio, dependente da presença de oxigênio. Acumular um tempo significativo em Z2 significa que o ciclista está proporcionando ao corpo o tempo e as condições ideais para otimizar os processos envolvidos no metabolismo oxidativo (aeróbio), melhorando assim essa capacidade fundamental”, explicou Vargas.

“São treinos que promovem melhorias em todo o sistema cardiovascular do praticante, além de proporcionar o benefício significativo de utilizar os ácidos graxos livres (gorduras em circulação) como fonte de energia. Treinar na Zona 2 na quantidade adequada garante que o ciclista possa desenvolver seu desempenho sem os mesmos riscos potenciais associados aos treinos de alta intensidade contínua. Isso ocorre tanto do ponto de vista da carga de treinamento quanto das adaptações morfológicas do corpo em resposta ao exercício”, complementou. 

Como treinar em Z2?

Segundo Vargas, a melhor solução para se manter na Zona 2 é procurar percursos sem subidas íngremes e focar no monitoramento da frequência cardíaca e nível de esforço. Para achar esta zona, o treinador tem uma boa dica:

“Vemos que, em boa parte da população, o topo da Z2 geralmente é 30 batimentos abaixo das maiores médias de FC para trechos de 20 minutos. Ou seja, procure em seus registros de prova ou treinos intensos (ou faça um teste): trechos muito fortes de aproximadamente 20 minutos e veja a FC média. Subtraia 30 batimentos e você terá um limite aproximado para esses treinos em Z2. Obviamente, isso é uma maneira extremamente simplificada de determinar a zona e tem uma grande margem de erro”, afirmou o treinador. 

Conforme explicou Vargas, a decisão de quando fazer treinos em Z2 depende do volume e frequência dos treinos, assim como da fase de treinamento do ciclista. Aqueles que pedalam pelo menos 4 vezes por semana são ideais para incluir treinos em Z2 regularmente, com 80% do tempo total de treinamento dedicado a essa zona como um bom ponto de partida.

“Isso envolve monitorar o tempo nas diferentes zonas, incluindo os treinos mais intensos. Simplificando, quem treina 4 ou 5 vezes por semana pode reservar 2 dias para intensidade, 1 dia para um treino longo misto (combinando períodos de intensidade com períodos em Z2 e Z3 baixa) e os demais dias exclusivamente em Z2”, afirmou. 

Evite erros comuns

Como ciclistas, todos nós temos o instinto de sempre pedalar o mais forte possível, e isso pode afetar mesmo seus treinos de baixa intensidade. Por isso, fique de olho nesta situação:

“A maior dificuldade é saber se sua Z2 realmente corresponde ao que se espera que a Z2 seja. Quando entramos na zona seguinte, a Zona 3, os processos metabólicos oxidativos permanecem, mas também começamos a metabolizar mais carboidratos e, consequentemente, a produzir (mas não acumular) mais lactato”, afirmou Vargas.

“Esses novos fatores também são muito interessantes para o treinamento, mas devido ao maior custo em termos de esforço da Z3, o treinamento começa a se tornar muito desgastante em relação aos benefícios percebidos, podendo prejudicar as sessões dedicadas à alta intensidade. Isso é extremamente comum e é um dos erros mais cometidos entre ciclistas amadores e até de elite. Então, claro, o ideal é que o treino seja inteiramente ou quase inteiramente dentro de Z2, mas não há motivo nenhum para pânico se beliscar um pouco de Z3”, complementou. 

Para ter certeza que você ainda está em Zona 2, mesmo sem ter um monitor de frequência cardíaca ou um medidor de potência é ficar atento à respiração, com o teste da falar uma frase inteira em voz alta sendo simples e muito efetivo. 

“A respiração em Z2 ainda é confortável, e é até possível respirar pelo nariz por algum tempo sem incômodo. Em Z2, o ciclista consegue manter uma conversa em ritmo de fala quase normal, praticamente sem pausas entre as palavras, apenas respirando um pouco mais que o normal entre elas”, afirmou o treinador. 

Além de procurar percursos com poucas subidas ou mesmo treinar no rolo, Vargas tem uma dica interessante para quem quer praticar mais o Z2, mas não quer deixar de pedalar em locais mais desafiadores, ou mesmo com outros ciclistas, a bicicleta elétrica:

“Às vezes a elétrica é até a melhor maneira de realizar esse treino, para evitar maiores esforços em subidas ou ao pedalar junto com ciclistas mais fortes (ou mais afobados). Já vimos até mesmo atletas de elite utilizando as e-bike para ajudar a manter o esforço sob controle ao treinar em percursos muito duros”, finalizou. 

Em resumo, os treinos de baixa intensidade não são apenas complementares aos treinos de alta intensidade, mas fundamentais para o desenvolvimento do desempenho atlético e para a manutenção da saúde. Por isso, se você quer otimizar seu metabolismo, fortalecer o sistema cardiovascular e reduzir o risco de overtraining, não deixe de praticá-los, já que eles garantem uma prática esportiva mais eficiente e sustentável ao longo do tempo.

E você? É adepto dos treinos em baixa intensidade? Compartilhe sua experiência conosco nos comentários de nossas redes sociais e nos vemos nos pedais!🙂

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