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Treinos duros, muita disciplina, competições desafiadoras, derrotas frustrantes e vitórias repletas de alegrias: certamente, a vida de atleta não é fácil, principalmente quando se está competindo no nível mais elevado do mundo.
Até mesmo por isso, participar de uma olimpíada não é o tipo de objetivo que se constrói do dia para a noite, e poucos atletas provam isso mais do que José Gabriel, mountain biker da Squadra Oggi que, atualmente, é um dos favoritos para representar nosso país nos jogos de Paris 2024, que estão marcados para acontecer em junho e agosto deste ano.
Atualmente com 29 anos, o ciclista nascido em Poços de Caldas, Minas Gerais, teve seus primeiros contatos com a bike ainda na primeira infância e, depois de se apaixonar pelos pedais, descobriu que eles poderiam ser seu passaporte para atingir grandes sonhos.
“Desde pequenininho, quando eu ganhei a minha primeira BMX, eu brincava com a minha mãe que ia conhecer o mundo pedalando. Então, desde muito pequeno, sonhava em chegar o mais longe possível: sonhava em Olimpíada, sonhava com o Mundial, sonhava em ser sempre um atleta bem competitivo, dentro do país e também fora. E hoje estou realizando tudo isso. Ainda estou longe, mas sei que estou no caminho certo”, revelou Zé.
A história de José Gabriel com o esporte, na verdade, vem desde antes dele nascer. Filho de pai atleta e irmão mais novo de um piloto de BMX, Zé teve seus primeiros contatos com a bike aos 3 anos de idade e, dos 6 aos 18 anos, com as bikes aro 20, obteve resultados expressivos em campeonatos paulistas, brasileiros e sul-americanos.
Com cerca de 18 anos, o piloto conheceu o MTB e, graças ao declínio do BMX e à falta de pistas para treinamento em sua cidade, resolveu fazer uma migração para as rodas grandes – uma missão difícil, que exigiu muita dedicação do piloto, principalmente graças à sua origem humilde.
Para dar seus primeiros passos no MTB, Zé vendeu tudo o que havia conquistado no BMX para comprar acessórios como luva, uniforme e capacete. Então, treinando com uma bike emprestada e com um preparador improvisado, com experiência no atletismo, Zé rumou para sua primeira competição de MTB: um Campeonato Brasileiro em Caconde, organizado por ninguém menos do que Edu Ramires, que hoje é Team Manager da Squadra Oggi.
Na prova, Zé conquistou seu primeiro pódio: um terceiro lugar com gostinho de quero mais, já que o segundo posto escapou dele por pouco, por conta de sua inabilidade de sprintar com a MTB.
Com muita gana de vencer, ele estudava pela manhã, trabalhava à tarde e treinava à noite. Mas, para pagar as provas e as viagens, era preciso trabalhar ainda mais, fazendo algumas horas extras.
“Sempre trabalhei com meu pai como pintor. Então, o que ele fazia por nós era pegar trabalhos na madrugada, e ali eu fazia o dinheiro das viagens”, contou o atleta que, depois de competir por um ano, propôs para o seu pai a ideia de parar de trabalhar para se profissionalizar.
“Meu pai confiou, mas fez a seguinte proposta: eu ia na primeira prova do ano e, se ganhasse, continuava; se perdesse, voltaria a trabalhar. Meio que sob pressão no meu último ano de Júnior, corri 22 provas e ganhei 20”, contou Zé.
Daí pra frente, o atleta seguiu galgando degraus importantes em sua carreira, até que, em 2021, passou a fazer parte da Squadra Oggi. Desde então, o piloto segue conquistando grandes resultados, mas também enfrentando grandes desafios – afinal, vida de atleta é assim mesmo.
“Em 2023 tive um ano sensacional. Tive muitos altos e baixos, mas foram mais altos do que baixos”, brincou.
“Foi um ano que consegui atingir grandes objetivos e, acima de tudo, me consolidar como um dos ponteiros na elite brasileira. Acho que isso é o que mais me deixou satisfeito no ano como um todo: me consolidar, ter uma constância maior nas provas e mostrar que um trabalho bem feito, durante um ano inteiro, faz toda a diferença”, completou.
Com o sonho de participar dos jogos olímpicos nascendo no BMX e continuando depois de sua migração para o MTB, José Gabriel acredita que, mais do que ter boas pernas e pulmões, correr entre os 50 melhores pilotos do mundo é uma questão de estratégia:
“O Ciclo Olímpico começou em 2022. Então, desde 2021, fiz uma preparação para subir no ranking. Aí, quando o ciclo começou, eu já era considerado um cara competitivo. De lá para cá começamos um jogo de xadrez, onde não é preciso ganhar todas as provas, mas sim estar bem em todas elas, para fazer uma constância. A ideia é acertar algumas provas como alvo e assim conseguir pontos preciosos, tanto para a nação quanto para mim”, revelou Zé.
“Falamos em xadrez porque temos provas que valem mais ou menos pontos. Além disso, tenho um número X de provas que posso correr. Então, tudo é um jogo de quebra-cabeça, um xadrez. Quando começa o ciclo, acredito que a parte mais fácil é treinar e correr. A parte de estratégia, de entender a dinâmica da pontuação é muito mais complexa do que você imagina, e isso afeta 100% na rotina”, explicou o atleta.
“Às vezes você pensa assim: ah o Zé vai chegar bem na prova X, e eu chego lá não tão bem, mas é porque ela já não vale tanto ponto pra mim pensando em Ciclo Olímpico, então é realmente um jogo de xadrez”, complementou.
Totalmente focado nos jogos de Paris, o piloto sabe que esta é uma de suas melhores oportunidades de brilhar entre os melhores do mundo, mas que sua carreira ainda tem muitos anos, e oportunidades, pela frente.
“Cada ciclo tem 4 anos, então acredito eu que já fiz parte de um ciclo olímpico que foi de Tóquio, mas não tão competitivo, já que eu tive uma lesão em 2019 que me tirou realmente da competição. Agora, estou participando bem ativo e sendo o atleta principal do ciclo da Paris 2024. Além disso, acredito eu que se tudo correr bem, o corpo deixar e for a vontade de Deus, ainda vou fazer mais um ciclo olímpico, que seria de Los Angeles.”, afirmou Zé.
Mais do que conquistar vitórias e construir uma vida ao redor disso, todo atleta de alto rendimento tem um objetivo em comum: deixar um legado para as próximas gerações, fazendo o esporte que ele ama se tornar ainda maior. Para Zé, participar dos jogos olímpicos é uma das partes mais importantes desta missão:
“Os Jogos Olímpicos trazem uma mensagem: eles são um legado, muito mais do que uma prova. É muito mais do que uma simples competição, desde a sua primeira edição. Para mim, chegar aos Jogos Olímpicos não somente para participar, mas para ser um pouco competitivo também é imensurável”, explicou Zé.
“É deixar um legado para um mundo inteiro, principalmente para a nossa nação. Apesar de não sermos ainda uma potência dentro do ciclismo, nós também somos incríveis. Independente de sermos ou não uma potência, nós também somos capazes. Com muita força de vontade, disciplina, dedicação e, acima de tudo, com muita vontade de realizar algo grandioso, também somos capazes de chegar lá.
“Temos que abdicar de muitas coisas, mas no final, tudo vale a pena. É deixar um legado para a nossa juventude de que o caminho é esse, e que eles sigam também, e que seja uma porta de entrada para quem sabe no futuro a gente não ser uma grande potência. Acima de tudo, é deixar um pouco de esperança para a juventude de que nós somos capazes também e escrever um pouco da história”, finalizou Zé.